Rondon, o herói do Brasil

Tempo de leitura: 9 minutos

Marechal Rondon ao lado de Aluízio Pinheiro Ferreira.
O empenho e a atuação do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, foi
fundamental para revelar aos centros “políticos e desenvolvidos” do Brasil uma
natureza fantástica, localizada no longínquo mundo amazônico do início do
século XX, palco de outras inúmeras aventuras e personagens que desafiaram as
adversidades que a floresta impõe aos invasores.
Árvores gigantescas e retorcidas, rios, lagos, cachoeiras, animais, mitos
e lendas que descortinaram uma realidade cultural profunda com temperos, aromas
exóticos e sedutores quase completamente desconhecidos pelo povo brasileiro.
Enganam-se os que associam à Comissão Rondon somente a construção de uma
linha telegráfica entre Cuiabá, capital do Mato Grosso e Santo Antônio das
Cachoeiras, localidade até então inconveniente para ocupação humana.
Alguns, ainda seduzidos por pobres polêmicas, buscam diminuir a
trajetória de Cândido Rondon focando sua atuação como “matador de índios ou
protetor dos índios”. Afirmaria, com toda tranquilidade, que esse é o debate
pobre e fútil sobre nosso maior personagem que serve somente para ridicularizar
quem o promove. Rondon liderou uma expedição épica, inimaginável, composta por
profissionais com grande experiência e várias especialidades que desenvolveram
estudos na área da geologia, botânica, cartografia, hidrografia, topografia e
geografia, além de estudos sobre as nossas fronteiras, produzindo farto
material sobre essa região da Amazônia.
Rondon no topo do Monte Roraima em 1927
A destemida expedição de Cândido Rondon deve, no mínimo, compor o cenário
das grandes expedições filosóficas e científicas que percorreram o interior do
Brasil e os rios amazônicos a partir do século XVIII. Condamine, Alexandre
Rodrigues Ferreira, os austríacos Spix e Martius, o barão de Langsdorf, os
ingleses Bates e Wallace, Dr. João Severiano da Fonseca e mais recentemente
Claude Lévi Strauss compõem parte dessa galeria de grandes exploradores e
pesquisadores.
Rondon foi muito além destes, pois carregava a missão de integrar um
território e suas gentes ao restante do Brasil. Foi muito além das questões
telegráficas e de fronteiras, dos estudos dos três reinos naturais: a fauna, a
flora e o mineral. Rondon foi além das tentativas de integração dos povos que
viviam em um mundo abandonado e esquecido na escuridão das florestas chuvosas,
quentes e úmidas. Ele levou e representou os valores de uma pátria, carregou em
si um Brasil inexistente na maior parte de seus gestos o que havia de melhor em
nosso país naquele momento. É tarefa complicada para qualquer historiador
encontrar um brasileiro com tamanha envergadura, espírito cívico, disposição e
coragem.
Marechal Rondon em acampamento em Vilhena – RO.
Cândido Rondon não se contentou em revelar ao mundo as “Terras de
Rondônia” como afirmou Roquete Pinto ou acompanhar o ex-presidente americano
Roosevelt em sua expedição a região do atual estado de Rondônia. Ele percorreu
a maior parte do território nacional em missões que somente os “homens
gigantes” enfrentavam. Por isso, o mesmo se destacou nacionalmente e
internacionalmente por suas preocupações com os povos indígenas, que sofriam
constantes massacres sem a mínima atuação do Estado em seu socorro. Como
criador do Serviço de Proteção ao Índio – SPI em 1910, instituição que se
transformou em FUNAI em 1967, Fundação Nacional do Índio, Rondon procurou atuar
na proteção e defesa dos povos e culturas indígenas.
Serviço de Proteção ao Índio idealizado por Rondon.
Cândido Rondon é indiscutivelmente o maior sertanista brasileiro de toda
nossa história, é esse o foco que deveríamos investigar, pois sua atuação ainda
ecoa sobre todos nós que moramos na porção ocidental do Brasil. A maioria dos
estudos feitos sobre nosso mais conhecido personagem histórico nos informa
sobre sua preocupação em preservar a cultura e as tribos indígenas.
Se houve conflitos, precisamos lembrar que Rondon atuou em uma época onde
a cultura existente pregava uma lógica desenvolvimentista que elegia os povos
indígenas como inimigos ou empecilho ao desenvolvimento urbano e “civilizado”
da época, um período onde era comum crer na máxima: “índio bom é índio morto”.
Rondon foi um verdadeiro brasileiro, em suas veias o sangue índio era evidente,
sua brasilidade era enraizada ao tempero e ritmo de sua gente, é contra a lógica
de genocídio que ele atua e milita. Seu ideal é o de um militar das “grandes
causas humanitárias”. Em função dessa realidade, Rondon é um dos poucos
personagens “oficiais” da nossa história que realmente merece ser promovido ao
panteão de grande herói nacional.
 RONDON,
SUA OBRA E HISTÓRIA.
  
Cândido Mariano da Silva Rondon teve sua origem humilde. Filho de um
tratador de animais, descendendo de espanhóis e índios terenas, de bandeirante,
e bororos, agigantando-se em nossa história, destacando-se como militar,
pacificador, cientista, construtor de estradas, de linhas telegráficas e
inúmeros outros serviços prestados ao País. Rondon constituiu-se um símbolo da
vontade humana, norteado pela religião que abraçou, baseada no amor à
humanidade, tendo como seu lema: “morrer se preciso for, matar nunca”.
Marechal Rondon quando criança em Mimoso.
Nasceu Cândido Mariano da Silva Rondon a 5 de maio de 1865 na Sesmaria de
Morro Redondo, nos Campos de Dourados, Estado do Mato Grosso, filho de Cândido
Mariano da Silva e de sua esposa Dona Claudina Evangelista. Anos depois de seu
nascimento acrescentou ao seu nome o sobrenome de seu tio e padrinho, Manuel
Rondon, com a devida autorização do Ministério da Guerra.
Graças a seu esforço e à sua capacidade nos estudos, o jovem natural de
Campos de Mimoso, aos sete anos foi conduzido pelo tio a Cuiabá, iniciando seus
estudos no Liceu Cuiabano e, já aos dezesseis anos, conseguiu um lugar de
Professor do Ensino Primário na mesma instituição de ensino. Porém, seu
espírito inquieto desejava maior dinâmica, o moço tinha vontade de ingressar na
carreira militar e eis que em 26 de novembro de 1881 integrou-se no 3°
Regimento de Artilharia à Cavalo e logo a seguir passou a frequentar a Escola
Superior de Guerra, na Capital Federal. Figurou desde logo nos quadros de honra
da Escola e pelo seu valor, já como 2° Tenente foi convidado para ministrar, na
própria Escola, as cadeiras de Astronomia e Mecânica Racional.
Academia Militar Imperial onde estudou Rondon – RJ
Rondon, a exemplo de uma lista imensa de outros sertanistas, demonstrou
incrível coragem e determinação ao atuar em regiões tão inóspitas no interior
do Brasil, deve ser citado ao lado de Antônio Rolim de Moura Tavares, primeiro
governante da Capitania do Mato Grosso. Domingos Sambucet, Engenheiro que
iniciou as obras do Real Forte Príncipe da Beira e faleceu de malária. Ricardo
Franco de Almeida Serra, Engenheiro que trabalhou no Real Forte Príncipe da
Beira após o falecimento de Sambucet. Francisco de Melo Palheta, bandeirante
que introduziu as primeiras mudas de café no Brasil e percorreu o trajeto entre
Belém do Pará e Vila Bela da Santíssima Trindade no Mato Grosso em meados do
século XVII. Luis de Albuquerque Melo Pereira e Cáceres, quarto Governador da
Capitania do Mato Grosso, foi na sua gestão que se construiu o Forte Príncipe
da Beira. Trabalhadores dos seringais e da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré.
Francisco e Apoena Meireles, grandes sertanistas e indigenistas.
Rondon estudante na Academia Militar – RJ.
Entre os vários títulos e homenagens, Marechal Rondon foi indicado ao
Prêmio Nobel da Paz no ano de 1925. O propositor de tal homenagem foi nada mais
e nada menos que o maior físico da história da humanidade, Albert Einstein.
Mais tarde, na década de 50, foi indicado apontado.
Nos anos de 1892 e 1898 ajudou a construir as linhas telegráficas de Mato
Grosso a Goiás. Entre 1900 e 1906 dirigiu a construção de mais uma linha
telegráfica, ligando Cuiabá e Corumbá, alcançando as fronteiras do Paraguai e
Bolívia. No início do século XX encontrou as ruínas do Real Forte Príncipe da
Beira, uma das maiores relíquias históricas de Rondônia. Em 1907, no posto de
major do Corpo de Engenheiros Militares, foi nomeado chefe da comissão que
deveria construir a linha telegráfica amazônica, e que foi denominada “Comissão
das Linhas Estratégicas e Telegráficas de Mato Grosso ao Amazonas”, também
conhecida como Comissão Rondon”. Seus trabalhos desenvolveram-se de 1907 a
1915.
Rondon na região de Mato Grosso em 1906.
Em 1910 organizou e passou a dirigir o Serviço de Proteção aos Índios
(SPI), criado em 7 de setembro de 1910. Em 12 de outubro de 1911 inaugurou a
estação telegráfica de Vilhena, na fronteira do estado do Mato Grosso e
Rondônia. Em 1914 participou da denominada Expedição Científica
Roosevelt-Rondon, junto com o ex-presidente dos Estados Unidos da América,
Theodore Roosevelt. Realizando novos estudos e descobertas na região. Durante o
ano de 1914 a Comissão Rondon construiu em oito meses, 372 km de linhas e
inauguraram outras cinco estações: Pimenta Bueno, Presidente Hermes, Presidente
Pena, Jaru e Ariquemes. Em 15 de dezembro de 1914, foi feita a ligação dos fios
da Seção do Sul com os da Seção do Norte, nas imediações da futura Estação
Presidente Pena, atual município de Ji-Paraná e em sessão solene realizada na
Câmara de Vereadores de Santo Antônio do Madeira, a 1° de janeiro de 1915,
comemorava-se a inauguração da gigantesca missão que lhe fora conferida, na ligação
dos fios de Cuiabá àquela localidade, bem como o ramal de Guajará Mirim.
Por tantos e inúmeros feitos, em 5 de maio de 1955, data de seu
aniversário de 90 anos, recebeu o título de Marechal do Exército Brasileiro
concedido pelo Congresso Nacional. Homenageando o velho Marechal, em 17 de
fevereiro de 1956, o Território Federal do Guaporé teve seu nome alterado para
Território Federal de Rondônia. O grande líder e “cacique branco” como era
denominado por alguns índios, veio a falecer no Rio de Janeiro, aos 92 anos, em
19 de janeiro de 1958.
Aleks Palitot
Historiador

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.