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Lucas Figueiredo é o convidado do Sempre Um Papo em Porto Velho para debate e lançamento do livro “Boa Ventura – A Corrida Do Ouro No Brasil (1697-1810)” (Grupo Editorial Record/Editora Record). Chuva na cabeça, sol na nuca, peste, fome, feras, canibais. Traições, intriga e corrupção. Esses são os ingredientes da nova obra desse escritor e jornalista mineiro. A história da primeira loucura a varrer o solo brasileiro: a corrida do ouro que ajudou a forjar nossa nação. Quando a esquadra de Pedro Álvares Cabral se desviou à direita do continente africano, era a cobiça sua bússola. Cravo e canela podiam render um bom dinheiro no Velho Mundo, mas eram as esperanças de ouro e prata que incendiavam o coração lusitano. E as cortes européias. Entrada gratuita.
Desde Manuel I, o venturoso, e sua improvável ascensão ao trono dos Avis, a obsessão lusitana por enriquecimento fácil tinha fincado suas raízes. E deitado ao mar milhares de homens pouco afeitos ao trabalho duro na terra. Mas afoitos pelo El Dorado. A sorte da Espanha em seu quinhão de América só servia para aquecer os delírios de nossa metrópole. Incontáveis expedições se aventuraram — e pereceram — nos sertões brasileiros em busca de qualquer coisa que reluzisse. Nosso próprio Sabarabuçu, versão tupiniquim da boa ventura espanhola.
Em “Boa Ventura – A Corrida Do Ouro No Brasil (1697-1810)”, Lucas Figueiredo traz à vida, pela primeira vez, a trajetória dura e demorada em direção à descoberta de nossas riquezas minerais — e suas conseqüências. A América Portuguesa estava entre as nove províncias gemológicas do mundo. Com um solo impregnado de pedras preciosas, sobretudo, diamantes. Mas foram mais de dois séculos até a Coroa ver algum sinal de riqueza. E apenas a metade do tempo para dilapidar esses recursos. Em cem anos, Portugal torrara mais de metade do metal precioso produzido no mundo naquele período.
Uma sucessão de monarcas perdulários, administradores corruptos e sonegadores de impostos desfilam nas páginas do livro com a familiaridade nascida da boa pesquisa. Lucas Figueiredo, com vários Prêmios Esso na bagagem, segue as pegadas fincadas nas picadas da mata por gerações de aventureiros. E traça um painel da grande transformação brasileira: estimulada pela corrida do ouro, a imigração contribuiu para transformar uma colônia esquálida de 300 mil habitantes em robusta colônia de 3,6 milhões. A busca pelo metal ajudou a ocupar e proteger as fronteiras do Brasil, a desenvolver a agricultura e até mesmo as artes. Só uma coisa não restou desse período… Seu principal protagonista: o ouro brasileiro. Pulverizado por toda Europa.
Fevereiro de 1876, o falido rei D. Luís I vasculha os cofres portugueses à procura de jóias e itens de valor que possam ser vendidos. Abandonada por décadas, longe do olhar de todos, uma pepita de ouro com aproximadamente 20 quilos chama a atenção. Último remanescente de uma época de riqueza incalculável para o velho império lusitano. Retirada de solo brasileiro, a pepita é prova viva de um dos momentos decisivos da história do Brasil Colônia e que deixaria marcas também na metrópole: a corrida do ouro. Depois da descoberta do El Dorado tupiniquim, os portugueses deixaram suas indústrias definharem, acreditando que poderiam comprar tudo o que quisessem. Donos de uma terra de que o dinheiro brotava do chão. Os detalhes da febre do ouro no Brasil e em Portugal ganham contornos de aventura sob a pena de Lucas Figueiredo. Das tentativas infrutíferas, até a descoberta — primeiro em Minas Gerais, depois Bahia e Goiás —, Lucas traça um painel inestimável do início da colonização brasileira.
Trecho do livro:
A maldição das Minas eram duas. Seu povo: “homens brutos e facínoras (…), cheios de todo o gênero de maldades, luxúrias, cobiças, dolos, invejas, homicídios, contendas, enganos, malícias e murmurações; (…) execrandos, ignominiosos, soberbos, arrogantes, inventores de todos os males e desobedientes; sem juízo, sem ordem, sem amizade, sem fidelidade e sem compaixão”. Em segundo lugar na lista de infelicidades das Minas, o conde apontava a riqueza metálica escondida debaixo da terra. “O ouro encerra e oculta em si muitas fezes…”, definiu, desta vez com poucas palavras.
Lucas Figueiredo nasceu em Belo Horizonte em 1968. Trabalhou na Folha de S.Paulo, como repórter e chefe de reportagem, e no Estado de Minas, como repórter especial. Colaborou com O Estado de S.Paulo, o serviço brasileiro da rádio BBC de Londres e as revistas Rolling Stone, Playboy, Caros Amigos, Superinteressante, Revista MTV, Nossa História e Defue Sud (Bélgica), entre outras. Figueiredo recebeu três vezes o Prêmio Esso, o mais importante do jornalismo nacional. O jornalista também foi agraciado com os prêmios Imprensa Embratel e Folha. São de autoria de Figueiredo os livros-reportagem Morcegos negros (2000), Ministério do silêncio (2005) — menção honrosa do Prêmio Vladimir Herzog —, O operador (2006) e Olho por olho (2009), todos publicados pela Record.
“Boa Ventura”, de Lucas Figueiredo (Grupo Editorial Record/Editora Record). Preço: R$ 39,90